As ameaças à biodiversidada - ameaças indiretas, o uso dos solos, a pesca e as plantas invasoras



Apesar da importância da biodiversidade na preservação do ecossistemas e na manutenção dos serviços prestados por estes, esta encontrasse ameaçada direta e indiretamente por diversos promotores de alteração. Segundo o Millennium Ecosystem Assessment os fatores indiretos são a demografia, fatores económicos, sociopolíticos, culturais e religiosos e científicos e tecnológicos.  Segundo o Millennium Ecosystem Assessment de entre os promotores indiretos temos que destacar o acentuado crescimento da economia global desde a década de 50 do século passado e que se estima que possa crescer entre três a seis vezes mais até 2050  a população mundial duplicou nos últimos 40 anos e estima-se que até 2050 alcance entre 8,1 e 9,6 mil milhões de pessoas; mudanças sociopolíticas com uma crescente descentralização do poder e um maior número de governos eleitos democraticamente; alterações culturais  que levam  a mudanças nas preferências dos consumidores e o desenvolvimento tecnológico. Todos estes fatores combinados têm provocado alterações nos serviços dos ecossistemas, a globalização contribuiu para a eliminação de barreiras nacionais permitindo a descentralização da produção, uma maior procura de alimentos e energia e o avanço tecnológico permitem novas e mais extensas formas de explorar os recursos naturais nomeadamente a exploração de combustíveis fósseis.
    Ao nível nacional destaca-se a situação de Portugal como membro da União Europeia e a influência das políticas e diretivas comunitárias, os efeitos da política agrícola comum, o intenso crescimento populacional urbano e a conjuntura económica do país (Proença et al., 2009) .
    Os fatores diretos que mais influenciam a biodiversidade são: a alteração e fragmentação nos habitats particularmente para usos agrícolas e construção de infraestruturas, alterações climáticas, espécies invasoras, sobreexploração de espécies e  poluição.
    Segundo o Millennium Ecosystem Assessment o fator direto que mais tem influenciado os ecossistemas terrestres, nos últimos 50 anos, são as alterações ao uso do solo.  Os sistemas de cultivo cobrem atualmente 24% da superfície terrestre.
    Em Portugal desde o séc. XIX e até à primeira metade do séc. XX a expansão da área agrícola foi uma dominante no território nacional (Daveau, 2000 citado por Proença et al., 2009) diminuindo diretamente a biodiversidade e criando situações de conflito entre as populações rurais e algumas espécies silvestres (Proença, 2009).  No entanto, a partir de metade do séc. XX a introdução de políticas de florestação e de cultivo provocaram alterações profundas na distribuição da população aumentando a tendência de desertificação das zonas rurais e um aumento da área de floresta de 5,2% entre 1974 e 2001 (Proença et al., 2009).
     O aumento da área da floresta não representa uma recuperação da floresta nativa, que atualmente representa 4% da floresta nacional, já que, principalmente a norte do Tejo, a floresta é dominada pela monocultura intensiva de eucalipto e de pinheiro, espécies pirófitas que podem provocar graves ameaças à biodiversidade (Proença et al., 2009).
    Relativamente à agricultura temos que distinguir a agricultura tradicional e a agricultura intensiva. A agricultura tradicional evoluiu ao longo de milhares de anos e permitiu uma adaptação de diversas espécies que dela dependem para a sua existência; permite também a limpeza de matas, a utilização de métodos de correção do solo sustentáveis, como a utilização fertilizantes naturais, a rega, a drenagem e a lavra desempenhando um importante papel na prevenção de incêndios e na conservação dos solos. A agricultura intensiva provoca um elevado desgaste nos solos,  contribui para a poluição do solo e da água através do uso de adubos, biocidas e pesticidas e, mundialmente, a agricultura é responsável por cerca de 70% do consumo total de água doce in Relatório Mundial das Nações Unidas sobre Desenvolvimento dos Recursos Hídricos 2016.
    O crescimento da população, a necessidade de produção de alimentos, a globalização  e a pressão existente pela sociedade de consumo para a obtenção de lucros cada vez maiores tem diminuído a prática da agricultura  tradicional.
    O fator direto que mais tem alterado os ecossistemas marinhos é a pesca intensiva.  A pesca afeta a estrutura, a função e a biodiversidade dos oceanos. A pressão da pesca é tão forte que em alguns sistemas marinhos a biomassa de peixes indicados para a pesca foi reduzida em 90% em relação aos níveis anteriores ao início da indústria pesqueira in Millennium Ecosystem Assessment.
    Nos ecossistemas de água doce e nas ilhas a principal ameaça são a poluição e as espécies invasoras in Millennium Ecosystem Assessment.
    No arquipélago dos Açores a biodiversidade das ilhas é mais vulnerável, devido à pequena extensão dos seus ecossistemas, ao seu isolamento e à fragilidade das espécies nativas face à invasão por organismos exóticos nomeadamente plantas.
Zona de floresta Laurissilva com plantas invasoras como a conteira e a hortência e zonas de pastagem
 
     O número de plantas exóticas introduzidas é relativamente elevado, sendo que, entre as 1002 espécies existentes, 690 foram introduzidas (68,9%). Dessas espécies introduzidas, algumas são consideradas infestantes devido ao seu carácter invasor que altera e, muitas vezes, destrói a estrutura das comunidades naturais onde se destacam as Pittosporum undulatum (incenso), Hedychium gardnerianum (conteira), Arundo donax (cana) e Hydrangea macrophylla (hortênsia) in Plano Regional de Erradicação e Controlo de Espécies de Flora Invasora em Áreas Sensíveis. A introdução destas plantas teve diversas origens nomeadamente ornamentação, criação de sebes e separação de campos agrícolas. As infestantes nos Açores foram introduzidas através da intervenção humana, estando este consciente, ou não, dessa introdução ou através de agentes naturais. A sua proliferação deve-se a vários fatores como a capacidade de dispersão e produção de grande quantidade de sementes. A atividade humana tem criado novas oportunidades de colonização e providência novos meios de dispersão (Barcelos, 2010).
   Estas espécies são uma ameaça séria para a biodiversidade de muitas áreas de vegetação natural da região e nesse sentido foram desenvolvidas metodologias e estratégias eficazes de irradicação e controlo das invasoras incluídas no Plano Regional de Erradicação e Controlo de Espécies de Flora Invasora em Áreas Sensíveis desenvolvido pela Direção Regional do Ambiente.
Durante muitos anos a imagem de marca do arquipélago eram as hortências (Hydrangea macrophylla) chegando mesmo a ser utilizadas em campanhas publicitárias das autoridades governamentais.

     Atualmente o programa de incentivo ao turismo sustentável, Prémio Miosotis que incentiva a adoção de padrões de produção e consumo sustentáveis estimulando a oferta e a procura de produtos de conceção ecológica, tem no seu layout uma planta endémica a Myosotis maritima (não-me-esqueças) o que demonstra a mudança de sensibilidade das autoridades  para a problemática da conservação da biodiversidade.
 Bibliografia:
   Barcelos, P. (2010) Infestantes, consultado a 04/11/2017 em:
   Direção Regional da Educação (2003) Plano Regional de Erradicação e Controlo de Espécies de Flora Invasora em Áreas Sensíveis consultado a 04/11/2017 em:
   - Millennium Ecosystem Assessment, 2005. Ecosystems and Human Well-being: Biodiversity Synthesis. World Resources Institute, Washington, DC.. pp. 8-10
   - Millennium Ecosystem Assessment, 2005. Ecosystems and Human Well-being: Biodiversity Synthesis. World Resources Institute, Washington, DC.. pp. 42-59
   Proença, V., Queiroz, C.F., Araújo, M., Pereira, H. M.. (2009). Biodiversidade. Capítulo 5.
   Relatório Mundial das Nações Unidas sobre Desenvolvimento dos Recursos Hídricos.  (2016). consultado a 05/11/2017 em http://unesdoc.unesco.org/images/0024/002440/244041por.pdf

Comentários

  1. Isabel,
    Parece que a agricultura intensiva é um empecilho à biodiversidade em qualquer ecossistema. Isto porque a degradação do solo, por muitas vezes, é irreversível, sendo Portugal um dos países Europeus com maior risco de degradação irreversível por erosão, seja pelo material ou pelo clima e relevo (Giordano et al., 1992; Sequeira 1998, in Domingos, 2009).

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá Natália!
      De facto a alteração ao uso dos solos é considerado, tanto por especialistas como por utilizadores, como um dos promotores de alterações dos ecossistemas prioritários. Em termos de importância a alteração ao uso dos solos, o regime de fogo, o crescimento económico e a Política Agrícola comum e os mercados globais foram considerados os mais importantes sendo todos de escala nacional e o regime do fogo foi considerado de velocidade rápida.
      A alteração do uso do solo inclui mudanças na florestação, abandono de terrenos, intensificação da exploração e o crescimento urbano e de infraestruturas.
      A redução das receitas agrícolas potenciada pela integração na UE, na política agrícola comum e nos acordos de comércio internacionais, juntamente com o aumento do custo de mão de obra, potenciado pelo crescimento económico e pelas migrações internas das zonas mais rurais para as zonas mais urbanas, juntamente com as alterações na estrutura de planeamento têm provocado alterações profundas em duas vertentes. Por um lado o abandono dos terrenos agrícolas que não eram rentáveis o que permitiu um crescimento da florestação com espécies de crescimento rápido como o eucalipto e o pinheiro e a diminuição da limpeza das matas o que cria condições para o surgimento de fogos florestais mais frequentes e severos. Por outro lado, procedeu-se à intensificação da prática agrícola utilizando práticas de mecanização e utilização de produtos químicos que permite uma maior produtividade mas que tem como consequências a erosão do solo e o consumo e poluição de recursos hídricos.
      O crescimento das zonas urbanas situadas sobretudo no litoral também contribui para uma degradação dos ecossistemas costeiros já potenciados pela poluição dos recursos hídricos, pela erosão dos solos e pelos incêndios.

      Domingos, T., Sequeira, E., Magalhães, M., Valada, T., Vicente, L., Martins, H., Ferreira, M.. 2009. Ecossistemas e Bem-Estar Humano em Portugal. Capítulo 3.

      Eliminar

Enviar um comentário

Mensagens populares